Caixas
O senhor Lanúvio herdara riquezas de família . Já idoso e sem descendentes , seu pensamento era ocupado constantemente com a ideia de legar seus bens .
De
fato a intenção dele não era a
venda , mas a observação das pessoas diante de suas escolhas . Conversava com
alguns de seus clientes , observava outros e assim conseguia saber mais sobre a natureza humana
Umas
caixas nada continham além de odores , tanto agradáveis quanto fétidos . Em algumas, miúdas e mal
acabadas, ele depositava preciosidades. Certas embalagens grandes podiam conter vazios enquanto outras estavam cheias de quinquilharias , ora valorosas, ora
boas para o lixo . Para o senhor , as mais divertidas
eram as que , ao serem abertas , pregavam sustos expelindo sons , projetando bonecos feios e debochados e as que
espalhavam cores , luzes e encanto por toda a loja .
Lanúvio
percebia a forte relação entre a personalidade das pessoas e as caixas escolhidas
e já pensara, com mais tempo , escrever um tratado sobre o assunto .
Uma
tarde , uma jovem de aparência discreta e modesta entrou na loja . Como se atraída magicamente foi direto ao encontro da minúscula caixa e ficou um bom
tempo com ela entre as mãos .
A moça , por sua vez , nunca perguntou coisa alguma e poderia saber
o preço do objeto já que no fundo da caixa havia uma etiqueta com o valor da peça .
Algumas
vezes Lanúvio se pegava pensando no que
teria havido com a ‘sua menina ’, como a denominou em
segredo . Imaginava como ela viveria, se era
só , se tinha família ou trabalho . E se estivesse doente ,
precisando de ajuda ?
O outono e seus ventos frios retirava as pessoas das ruas deixando a paisagem vazia . Foi quando a moça adentrou o estabelecimento apertando o casaco e se direcionou, rápida , ao novo local , pegou a caixinha com as mãos enluvadas e a revirou
entre os dedos .
O coração do velho rejuvenesceu. Parou o que
fazia e esperou, ansioso .
Desta
vez ela
pareceu perceber a ausência do preço e abriu a caixa . Leu o bilhete e, pálida , se aproximou do balcão , dirigindo-se ao velho .
Lanúvio,
emocionado, identificou de imediato o rosto de sua irmã caçula desaparecida
durante a guerra , cujos traços já adivinhara na jovem que agora reconhecia.
2 Comments:
lindo angela, daria um belo filme!!!
10:34 PM
Obrigada Dudu, pela leitura.
Eu adoraria ter um conto filmado... quem sabe, um dia. Mas escrever já me dá muito prazer. Creio que deve dar a vc também, não?
3:13 PM
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